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Quem disser que não existe um oásis em pleno sertão nordestino, onde o sol castiga tudo e todos, está mentindo. “Minha gente sempre morou aqui na serra. Há muito tempo. O sertão vem subindo e quando chega aqui, alcança o ‘tope’. Por isso ‘Sítio do Tope’ é o nome de nossa comunidade. Porque fica aqui no alto.” Quem fala assim tão simples é Francisca Rodrigues Ramos do Nascimento, antiga moradora e liderança reconhecida do Sítio do Tope, localizado em Viçosa do Ceará, um paraíso em meio à secura do sertão.
“Estou aqui desde 1939 e sempre mexendo com o barro. Desde os 12 anos queria fazer coisas só minhas porque queria ter meu dinheirinho. Aprendi com minha tia. No tempo dela e dos meus pais, tudo era feito de barro. Não existia mesa, a gente sentava na esteira e comia. Nesse tempo, a gente chamava tudo de loiça. Não era cerâmica. Tinha os pratos, as jarras galegas e os camburãozinhos (jarro bojudo) para coar café. Mas a vida vai mudando. Hoje ninguém usa mais essas coisas. Compra tudo pronto e tem muita pressa.”
Francisca não esconde que sempre teve vontade de fazer figuras. “Eu via no jornal, nas revistas, e achava que não sabia. Um dia veio um grupo aqui para organizar a gente e trouxe uma pessoa para dar curso. Foi bom, aprendi algumas coisas. Mas percebi que já tinha meu jeito de fazer. Aprendi a fazer o rosto olhando o nosso.”
Em 2005, Francisca recebeu o título de Mestre da Cultura, na cidade de Crato (CE), o que lhe dará um salário mensal para que possa ensinar mais pessoas. “Esse reconhecimento custou muito. Muita gente já se foi. O trabalho era muito sofrido. Muitas mulheres que morreram deveriam ter recebido esse prêmio. Recebo por elas.” E, sem perceber, Francisca homenageia também suas ancestrais, as mulheres das etnias Arariú, Tabajara, Tucuruju, Ararema e Anacesi, que desde sempre batiam o barro para fazer seus potes e panelas. |