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Não se pode pensar no Mato Grosso, sem falar da viola-de-cocho. Qualquer forasteiro ficará se perguntando como tirar um som inspirado daquelas cinco cordas de pesca, sem caixa de ressonância como os violões atuais.
Quem pode explicar essa história é seu Caetano Ribeiro dos Santos, um dos mais antigos “fazedores” de viola-de-cocho em Cuiabá, sempre acompanhado de seu Manoel Severino de Moraes, amigo e também fazedor de viola. Mesmo com a saúde debilitada, seu Caetano fica feliz com as visitas. “Vou contar as histórias, mas vou pontear e cantar também.”
E então começa.
“Meu pai fazia a viola-de-cocho para sua própria serventia.
A gente queria dançar, era dia de festa e era preciso uma viola. De cocho, porque o pau é cavoucado, como os cochos no pasto. Então, desde os 12 anos de idade, quando morava ainda em Barão de Melgaço (MT), já tirava lascas de pau com um canivetinho afiado.“ Em 1946, veio embora para Cuiabá. “Fazia tarrafa, mas foi proibida e então inventei de fazer viola-de-cocho por aqui.” Hoje, toda a sua família trabalha esculpindo viola-de-cocho. Os nomes das madeiras são relatados com uma explosão de termos locais que por si só parecem uma melodia: ximbuva, xarã-de-leite, cajamanga, jacoté ou serigüela. A viola normal é uma empreitada de mais de 15 dias e sempre são requisitadas. “Antes, fazia só para minha despesa. Cantava cururu e siriri nas festas de devoção e nas festas juninas, que duravam cinco dias”, explica seu Caetano. “Hoje, os pedidos são muitos, pois a viola-de-cocho virou produto típico do Mato Grosso. A gente faz a de verdade e as pequenas para quem quer uma lembrancinha.”
Seu amigo e parceiro Manoel tem uma história semelhante. Primeiro faz questão de dizer que é verdadeiramente um cuiabano e que começou a viver em torno da viola-de-cocho desde os 10 anos de idade (dois anos mais cedo que o amigo). Falante, desafia o companheiro. “A melhor madeira que existe é a mangueira. Eu comia a fruta e fazia viola do pau. Hoje em dia? Se você achar quem derrube a mangueira, eu faço.” Também aposentado, complementa suas rendas com as
violas-de-cocho.
Seu Caetano tem certeza de que sua viola-de-cocho vai seguir de pé, porque hoje, virtuose como Abel Santos Anjos Filho, ponteia nela as danças do siriri e de São Gonçalo até dedilhados medievais e andantes que nos remetem aos grandes mestres da música clássica. Quase inacreditável pensar que se trata da viola-de-cocho. |